MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927/2020: COVID-19 X DIREITOS TRABALHISTAS

A nação brasileira foi despertada com a agressividade do coronavírus (COVID-19), levando as pessoas ao refúgio de suas casas e a decretação de estado de calamidade pública pelo Presidente da República, conforme o Decreto Legislativo nº 6/2000, publicado no Diário Oficial no dia 20 de março de 2020.

Com isso, o Presidente da República, também precisou manifestar-se sobre as relações trabalhistas e, para tanto, editou a Medida Provisória nº 927 de 22 de março de 2020, dispondo de medidas trabalhistas que devem ser adotadas para o enfrentamento do período de calamidade pública.

A referida medida provisória é dotada de 39 artigos, dentre eles são tratados os seguintes temas: (I) teletrabalho; (II) antecipação de férias individuais; (III) concessão de férias coletivas; (IV) aproveitamento e antecipação de feriados; (V) banco de horas; (VI) suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; (VII) direcionamento do trabalhador para qualificação; e (VIII) diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS).

Dentre todas as medidas apresentadas, houve grande comoção social quanto o “direcionamento do trabalhador para qualificação”, disposto no artigo 18 da referida Medida Provisória nº 927.

A agitação da população foi tanta que, no dia seguinte à divulgação da Medida Provisória, houve a revogação do referido dispositivo através da Medida Provisória nº 928 de 23 de março de 2020.

Em suma, o referido dispositivo revogado permitia a suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses, sendo que durante essa suspensão o empregador deveria oferecer ao empregado cursos ou programas de qualificação profissional. Ainda, determinava que durante a suspensão contratual, o empregado faria jus aos benefícios voluntariamente concedidos pelo empregador.

Fato é que a grande maioria das medidas para o contrato de trabalho apresentadas pela Medida Provisória nº 927 continuam em vigor e devem ser observadas nos próximos dias, enquanto durar o estado de calamidade pública, são essas:

  • TELETRABALHO:

É facultativo ao empregador adotar o regime de teletrabalho no lugar do trabalho presencial, sem necessidade de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho, exigindo-se apenas que o empregado deverá ser notificado com antecedência mínima de quarenta e oito horas, verbalmente ou por escrito.

  • ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS:

É facultativo ao empregador antecipar as férias individuais do empregado, desde que notifique o empregado sobre tal medida no prazo mínimo de quarenta e oito horas, por meio escrito ou eletrônico, devendo ser estabelecido o período a ser gozado pelo empregado.

Referida antecipação de férias não poderá ser por período inferior à 05 dias e poderão ser concedidas ainda que o período aquisitivo não esteja completo, bem como poderá haver negociação entre as partes de antecipação de períodos futuros de férias.

Nos casos de antecipação de férias individuais, o empregador poderá optar por efetuar o pagamento do adicional de um terço de férias após sua concessão, tendo o prazo de pagar tal verba até a data que é devida a gratificação natalina.

Da mesma maneira, a Medida Provisória nº 927 prevê a possibilidade do empregador em pagar a remuneração das férias até o quinto dia útil subsequente ao início do gozo das férias, deixando de aplicar o previsto pelo artigo 145 da CLT, que prevê o pagamento de tal verba 02 dias antes do início do gozo de férias.

  • POSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DE FÉRIAS E LICENÇAS DE PROFISSIONAIS DA SAÚDE:

Dentre as disposições que tratam da antecipação de férias individuais, pela Medida Provisória nº 927, há previsão de possibilidade de suspensão de férias e licenças não remuneradas dos profissionais da área de saúde ou daqueles que desempenhem funções essenciais, desde que haja comunicação formal do empregador ao empregado, preferencialmente e não obrigatoriamente, com antecedência mínima de quarenta e oito horas.

  • CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS:

Também de maneira facultativa, o empregador poderá conceder férias coletivas a seus empregados, os quais deverão ser notificados com antecedência mínima de quarenta e oito horas, sendo dispensada a comunicação prévia ao órgão local Ministério da Economia e a comunicação aos sindicatos representativos da categoria profissional.

  • APROVEITAMENTO E ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS:

Os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais, sendo que no caso de feriados religiosos deverá haver a concordância do empregado, mediante manifestação em acordo individual escrito.

  • BANCO DE HORAS:

Restou autorizada a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial de compensação de jornada através de banco de horas, que deverá ser estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual formal, com compensação no prazo máximo de dezoito meses a contar do encerramento do estado de calamidade pública.

Para a recuperação do período interrompido, a jornada do empregado poderá ser estendida em 2 (duas) horas diárias, não excedendo a 10 (dez) horas diárias;

  • SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO:

Restaram suspensas, enquanto durar o estado de calamidade pública, as seguintes obrigatoriedades: exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares. Com exceção apenas dos exames demissionais, porém, esse também poderá ser dispensado no caso de existir exame médico ocupacional recente, com menos de cento e oitenta dias.

  • SUSPENSÃO DO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO (FGTS):

Restou suspensa a exigibilidade do recolhimento de FGTS pelos empregadores, quanto as competências de março, abril e maio de 2020, sendo que esses valores deverão ser recolhidos em até 6 (seis) parcelas mensais a partir de julho de 2020.

  • PROFISSIONAIS DA ÁREA DE SAÚDE:

Dentre tantas disposições gerais estabelecidas a partir do artigo 26 da Medida Provisória nº 927, vale ressaltarmos que, para os estabelecimento de saúde, restou autorizado, mediante acordo individual escrito: (I) a prorrogação da jornada de trabalho, observando o artigo 61 da CLT, que prevê, dentre tantas outras obrigatoriedades, a duração máxima de 02 horas da prorrogação de jornada, diariamente; (II) a adoção de escalas de horas suplementares entre a décima terceira e a vigésima quarta.

  • PROFISSIONAIS DE TELEATENDIMENTO E TELEMARKETING

A Medida Provisória nº 927 não se aplica aos trabalhadores de teleatendimento e telemarketing.

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Dentre tantos dispositivos, a referida Media Provisória nº 927 levantou, ao mesmo tempo, temas até então adormecidos na Justiça do Trabalho e reafirmou outros já consagrados.

O teletrabalho, por exemplo, é regime usualmente aplicado por muitos empregadores, mesmo antes da instauração de tal pandemia, mas o tema sempre é discutido na Justiça do Trabalho quanto aos gastos de energia elétrica, água, internet ou até mesmo a utilização de telefone ou celular pessoal do empregado enquanto presta serviços através do regime de teletrabalho.

Da mesma maneira, o texto da Medida Provisória nº 927 afirmou, expressamente, a necessidade de comprovação de nexo causal para que a contaminação pelo coronavírus (covid-19) seja considerada como doença ocupacional, fato que não é novidade para nenhuma relação de trabalho.

Diante do referido cenário, não restam dúvidas de que a Justiça do Trabalho será amplamente acionada em decorrência de diversas lacunas legais quanto as providências que os empregadores e empregados estão sendo obrigados a adotar durante esse período de calamidade pública.


Autoras: Dra. Viviane Regina Vieira Lucas e Dra. Giovanna Branco de Moraes Almeida

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